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Pesquisa revela dados sobre precariedade das condições de trabalho das agentes penitenciárias do PR'

Em Encontro Estadual, agentes femininas reclamam de invisibilidade num sistema pensado por e para homens
24/08/2018


Agentes penitenciárias de todas as regiões do estado estiveram reunidas na manhã desta quinta-feira (23) na UFPR, onde aconteceu o 1° Encontro Estadual das Agentes Penitenciárias do Paraná. O evento originou uma Carta que será entregue a todos os órgãos responsáveis pela execução penal e para entidades ligadas à defesa dos direitos humanos e das mulheres.

O Encontro foi organizado pelo SINDARSPEN, por meio da Diretoria de Assuntos para Mulher, após uma sucessão de denúncias feitas pelas servidoras das péssimas condições de trabalho nas unidades no estado.

O debate teve como base a pesquisa realizada pelo Sindicato em julho e agosto – e que teve a participação de 32% das agentes do estado –, na qual as trabalhadoras de unidades femininas e masculinas responderam sobre condições gerais de trabalho, saúde das agentes, condições de trabalho x saúde e condições de trabalho x questões de gênero. A pesquisa foi realizada e apresentada pela jornalista Waleiska Fernandes.

O perfil das 365 agentes que atuam nas 33 unidades penais do Paraná é revelado pela pesquisa: mais da metade tem entre 31 e 40 anos, 68% são mães, 80% têm curso superior completo e mais de 90% trabalha exclusivamente no sistema penitenciário. 

Apesar do elevado nível de entrega ao trabalho e de capacitação adquirido fora do sistema, 59% delas se consideram insatisfeitas com a autonomia da tomada de decisões; 75% se dizem insatisfeitas com a quantidade de mulheres que ocupam espaços de comando no sistema penitenciário; e 90% estão insatisfeitas com a capacitação que recebem do Estado para a execução de suas funções.

O estudo também mostra que a falta de efetivo nas unidades penais é um dos pontos mais angustiantes para as trabalhadoras. 89% delas estão insatisfeitas com a quantidade de agentes em sua unidade e quase 93% dizem que o número de agentes para dividir as tarefas compromete a segurança na unidade.

Quando o assunto é a condição como mulher, os números também traduzem elevado nível de insatisfação: 75% delas estão insatisfeitas com a quantidade de mulheres nos espaços de comando no sistema e 61,5% declararam que já se sentiram constrangidas com comentários ou insinuações machistas no trabalho. 90% delas acham que o DEPEN precisa implantar uma política permanente de combate ao assédio moral e 82% de combate ao assédio sexual nos locais de trabalho. 
 

Questões básicas são descumpridas 
 
Se os números sobre a realidade das agentes do Paraná já revelam dados alarmantes, o cotidiano narrado por elas mesmas são ainda mais preocupantes.  Na Penitenciária Feminina de Piraquara (PFP), por exemplo, 3 agentes precisam movimentar quase 400 presas por dia para tomar banho, já que não há chuveiro nas celas das unidades. 
 
Na Colônia Penal Agrícola (CPAI), em Piraquara, uma agente é responsável pela portaria da unidade durante a madrugada, sem qualquer equipamento de segurança.

No Centro de Ressocialização Feminino (CRESF), em Foz do Iguaçu, as portas de celas permitem que as agentes sofram agressões constantes por parte das presas. 

As agentes que trabalham com a operação de body scan não usam equipamentos de segurança obrigatórios para quem trabalha com esse equipamento. 

“Ver esse auditório lotado de mulheres, algumas que passaram a madrugada viajando, é reflexo do que estamos vivendo no sistema. Essas mulheres estão todas aqui pra pedir socorro. Ninguém aguenta mais as condições de trabalho a que estão submetidas”, avaliou a agente aposentada Dejanira Veloso, que compôs a mesa do Encontro, como a primeira mulher a entrar na luta sindical em defesa da categoria. 
 
 
Soluções possíveis

Além de mapear os problemas e trazer as questões ao debate, o 1º Encontro Estadual das Agentes Penitenciárias também se propôs a apontar caminhos para resolver essas questões. 

Para a coordenadora das Unidades Prisionais Femininas e Cidadania LGBT da Secretaria de Estado e Administração Penitenciária do Rio de Janeiro, Ana Cristina Faulhaber, é preciso romper o ciclo de violência que existe no ambiente de trabalho penal. “Somos violentadas institucionalmente. E se você é violentada, você reflete isso na relação com as presas”. Ana narrou uma série de iniciativas que vêm dando certo no estado fluminense, tornando mais humanizado o ambiente de trabalho para as agentes. 

A professora Ciências Políticas da Unicuritiba e pesquisadora da Rede de Mulheres, Paz e Segurança da ONU, Karla Pinhel falou sobre o a necessidade de cumprimento no Paraná dos compromissos assumidos pelo Brasil junto à comunidade internacional de aprofundar e difundir conhecimento específico junto às mulheres da área de segurança, conforme preconiza a Resolução 1325 das Nações Unidas.

O secretário Especial de Administração Penitenciária (SEPEN), Coronel Élio Manoel, disse que o órgão está em processo de transição para deixar de ser uma secretaria especial e passar a ter autonomia administrativa e financeira, e que mesmo nesse período transitório duas das maiores reclamações das agentes estão no foco das atuações da SEPEN: a automação das unidades e a contratação de novos agentes. Segundo ele, o projeto de automação das unidades está em execução e o DEPEN já trabalha na preparação de um concurso para a carreira. 

A corregedora do DEPEN, Lucia Beloni, anunciou a construção do muro para separar o CRESF da unidade masculina Laudemir Neves, uma reivindicação das agentes locais. “Também vamos designar uma mulher para a chefia da segurança da unidade”, anunciando a agente Fabiana Antunes Ribeiro para o posto.
 
 
Carta de Curitiba

Ao final do evento, as agentes penitenciárias aprovaram a Carta de Curitiba, documento que sintetiza as principais reivindicações das trabalhadoras e que será entregue às autoridades da execução penal no Paraná e às entidades ligadas à defesa dos direitos humanos, dos direitos dos trabalhadores e dos direitos das mulheres. 
 
“Quando nós pensamos esse Encontro, pensamos em algo que elevasse a nossa autoestima, nos mobilizasse e que nos unisse pra que juntas possamos lutar fortalecidas por tudo aquilo que precisamos no sistema. A humanização do sistema deve passar pela nossa voz, pelo nosso protagonismo”, declarou a diretora de Assuntos para a Mulher do SINDARSPEN, Silvana Dantas, que coordenou o evento. 
 
Também acompanharam o Encontro o diretor da Escola Penitenciária do Paraná, Henrique Dondoni, a presidente da Federação dos Conselhos da Comunidade do Paraná (FECCOMPAR), Maria Helena Orreda, a presidente do Conselho da Comunidade de Curitiba e Região Metropolitana, Isabel Krugler, a coordenadora da Pastoral Carcerária no Paraná, Irmã Luciene de Mello, o assessor o deputado estadual Tadeu Veneri (presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa), Luís Rosa, e o professor do Departamento de Psicologia da UFPR, Marcio Ferraciolli. 












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